O novo tempo do mundo by Paulo Arantes

O novo tempo do mundo by Paulo Arantes

Author:Paulo Arantes [Arantes, Paulo]
Language: por
Format: epub
ISBN: 9788575593721
Published: 2014-06-03T00:00:00+00:00


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Pois foi no ponto culminante dessa escalada de normalização do estado de exceção como paradigma de governo, entendido como gestão de emergências que poderiam demandar ora um campo, ora um “decreto de economia”, ora a militarização do trabalho, ora a aplicação de políticas sociais por meio de pactos de guerra, que Walter Benjamin redigiu sua oitava Tese sobre o Conceito de História. Antes de explicar a intromissão, melhor transcrevê-la por extenso:

A tradição dos oprimidos nos ensina que o “estado de exceção” [Ausnahmezustand no original; state of emergency na tradução inglesa, P. A.] no qual vivemos é a regra. Precisamos chegar a um conceito de história que dê conta disso. Então surgirá diante de nós nossa tarefa, a de instaurar o real estado de exceção; e graças a isso, nossa posição na luta contra o fascismo tornar-se-á melhor. A chance deste consiste, não por último, em que seus adversários o afrontem em nome do progresso como se este fosse uma norma histórica. – O espanto em constatar que os acontecimentos que vivemos “ainda” sejam possíveis no século XX não é nenhum espanto filosófico. Ele não está no início de um conhecimento, a menos que seja o de mostrar que a representação da história donde provém aquele espanto é insustentável.[99]

Não cabe por certo no âmbito restrito desta Nota Introdutória sequer esboçar uma enésima glosa dessa tese cuja atualidade parece não ter fim e colar em todas as conjunturas. Muito embora seja precisamente esse o caso do exposto até aqui. Salvo engano, essa tese vem a ser a primeira célula temática de um diagnóstico histórico-filosófico da Era da Emergência que acabava de se abater sobre o mundo e que hoje, de “tréguas” em “desmoronamentos”, se encontraria, até onde a vista alcance, num terceiro fim de linha da emancipação que não se deu e continua a não se dar. Uma filosofia da história – concentrada no relance vertiginoso de um enunciado – reescrita do ângulo da exceção, nos antípodas do gênero filosófico inventado pela crítica iluminista no século XVIII e cujo utopismo moral obscurecia a crise, que ao mesmo tempo se agravava e pedia uma decisão política, que por isso mesmo, oculta pelas imagens histórico-filosóficas do futuro, tomou um rumo inesperado, o destino desastroso de um estado de crise permanente – a guerra civil, sob cuja lei vivemos até hoje, no argumento notável de Koselleck sobre a gênese burguesa da filosofia da história na abertura dos tempos modernos, na qual dissimulação e agravamento da crise são um único e mesmo processo[100]. Ao moralizar a política, a modo de garantia da utopia para a qual a história correria, o militante burguês afinal não viu a revolução que se avizinhava como uma guerra civil, mas como o cumprimento de postulados morais, em nome dos quais finalmente refugiou-se na violência pura. (Como Hegel estreou na vida filosófica demolindo a visão moral do mundo e do progresso, embora tenha levado o gênero Filosofia da História à sua culminância niilista – por onde passa, o Espírito não deixa pedra



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